Fortes incêndios florestais tornam a atingir países da Bacia do Mediterrâneo
Más práticas de gestão florestal, crise económica, alterações climáticas e negligência humana ameaçam as florestas mediterrâneas
No final da "época oficial" dos incêndios florestais, a WWF revela que mais de 300,000 ha de florestas e terrenos agrícolas, com elevado valor económico e ambiental, em Portugal, Itália, Grécia, Espanha e Turquia, foram severamente atingidos este Verão por incontroláveis incêndios florestais.
Grandes áreas de importantes ecossistemas e valiosos terrenos produtivos, como os parques nacionais de Garajonay nas Ilhas Canárias e de Cabañeros no Centro de Espanha; importantes áreas rurais como as terras de goma de aroeira (Pistacia lentiscus var chia), na ilha de Chios, Grécia, ou o Sítio Natura Serra do Caldeirão, no Sul de Portugal, foram gravemente afectados pelos fogos florestais neste verão.
Segundo o Relatório de Avaliação dos Impactes sobre Espaços Florestais Decorrentes do Incêndio Florestal de Catraia (Tavira) o incêndio que ocorreu na Serra do Caldeirão afectou uma área de 24,843 hectares que representam aproximadamente 17% da sua superfície total (destes, 8090 hectares pertencem à Zona de Protecção Especial (ZPE) e Sítio de Importância Comunitária (SIC) do Caldeirão). Este incêndio afectou áreas em que ocorrem espécies ameaçadas como a águia-de-Bonelli, a águia-cobreira e o bufo-real e ainda habitats adequados para o ocorrência de lince-Ibérico. Ao nível do património cinegético, este incêndio atingiu 33 zonas de caça.
De acordo com a ferramenta HABEaS - Hotspot Areas for Biodiversity and Ecosystem Services (
www.habeas-med.org), desenvolvida pela WWF, o incêndio afectou também cerca de 25 mil hectares onde ocorrem espécies endémicas da Península Ibérica, como o tritão-de-ventre-laranja, a rã de focinho pontiagudo, o sapo-parteiro-Ibérico e a cobra-de-pernas-pentadáctila.
Arderam ainda aproximadamente 4600 hectares de habitats prioritários identificados dentro da ZPE e SIC do Caldeirão. Em relação aos impactes sobre recursos hídricos, o incêndio deu-se a poucos quilómetros do limite superior dos aquíferos M8 - São Brás de Alportel, M13 - Peral - Moncarapacho e M14 - Malhão, podendo afectar áreas importantes para a recarga destas massas de água subterrâneas.
Ainda segundo o relatório citado anteriormente, o custo da recuperação da área ardida no Algarve será superior a 3,7 milhões de euros, em intervenções com vista a mitigar os efeitos da erosão ao nível das linhas de água, encostas e infra-estruturas.
Apesar da natureza inflamável da floresta Mediterrânica, as alterações climáticas, a negligência humana e, sobretudo, a falta de uma adequada gestão florestal que actue ao nível da prevenção dos incêndios, formam uma combinação letal que ameaça as florestas e meios de subsistência das populações.
No caso da Grécia, os drásticos cortes orçamentais, resultantes da crise económica, afectaram os sistemas de combate a incêndios, segundo a WWF Grécia. Por exemplo, os 5 helicópteros que formam a brigada de incêndios grega não puderam voar na época de incêndios de 2012, uma vez que a licença de voo dos pilotos tinha caducado e a sua renovação está atrasada por motivos financeiros.
No caso Português, continua a destacar-se como causa principal dos incêndios uma inadequada gestão florestal;
A WWF apela aos governos do Mediterrâneo e à União Europeia para empreenderem acções urgentes para a conservação das florestas. Os escritórios da WWF que trabalham na Bacia Mediterrânica - Portugal, Itália, Grécia, Espanha e Turquia afirmam que:
O foco dos esforços relativamente aos incêndios florestais deve passar do combate para a prevenção, através da efectiva implementação da gestão florestal responsável a longo prazo. A gestão florestal responsável é mais eficaz e financeiramente mais eficiente do que o financiamento de gigantescos mecanismos de combate a incêndios usados todos os anos. Os incêndios florestais previnem-se, não se combatem.
A prevenção dos fogos florestais deve realizar-se tendo por base os princípios da gestão florestal sustentável. Implementar esquemas de certificação florestal, como o Forest Stewardship Council (FSC), é um contributo importante para a prevenção dos incêndios, para a conservação da biodiversidade e valorização dos produtos florestais.
Adoptando o sistema de gestão florestal FSC, será possível: 1) Aproximar o cidadão da floresta, fazendo de cada pessoa um agente de conservação da floresta, pela introdução de mecanismos de Participação Pública efectiva; 2) Valorizar os serviços ambientais da floresta, premiando quem gere melhor. O FSC é um mecanismo de diferenciação positiva, que cria mais-valia ao gestor florestal que presta serviços ambientais à sociedade, como a gestão para a prevenção dos incêndios florestais ou a gestão adequada de Áreas de Alto Valor Conservação; 3) Demonstrar que o Estado dá o exemplo na aplicação das Boas Práticas de Gestão Florestal, certificando as florestas públicas através de um sistema independente e credível;
É urgente sensibilizar e educar as sociedades sobre os valores dos ecossistemas florestais do mediterrâneo e sobre a prevenção de incêndios florestais.
A gestão florestal deverá ser articulada com os mecanismos de combate aos incêndios florestais para que haja uma eficiente e atempada supressão dos incêndios.
A coordenação efectiva entre as diferentes entidades ligadas ao combate aos incêndios florestais é vital.
"Comportamento responsável e gestão florestal responsável são os melhores meios para evitar fogos florestais. As ferramentas de gestão florestal responsável, como a certificação FSC, podem ajudar os proprietários e silvicultores a gerir as suas terras. Boas práticas de gestão previnem fogos florestais, asseguram a conservação da biodiversidade e acrescentam valor extra aos produtos da floresta", afirma Rui Barreira da WWF em Portugal.
http://www.agroportal.pt/x/agronoticias/2012/10/02b.htm