Kyoto, prioridades ambientais da UE e outras historinhas para boi dormir
João Luís Pinto
Todos estes recentes desenvolvimentos relativos à questão dos combustíveis e aos pescadores e transportadores, e concretamente a reacção do nosso governo, demonstra toda a hipocrisia e wishful thinking que rodeiam os ambiciosos planos e as urgentes metas em termos de emissões.
No momento em que a pressão dos preços dos combustíveis cria uma oportunidade ímpar para forçar ao aumento da racionalidade do consumo de combustíveis fósseis, no fundo dando aos agentes do mercado um relance daquilo que os espera no futuro, quer pela pressão crescente da procura sobre as reservas disponíveis de petróleo, quer pela própria expressão da vontade dos nossos governantes, quer a nível interno quer a nível externo, de que se deve caminhar nesse sentido, o nosso governo, presidido por um Sócrates que, lembre-se, já teve responsabilidades na tutela do Ambiente, demonstra a vontade de vacilar e criar mecanismos de excepção exactamente em dois dos sectores de maior dependência desses combustíveis e intensidade energética.
Ou seja, aqueles que são dos principais responsáveis pelo crescendo da procura, e um dos principais agentes do consumo desses combustíveis, vão ser exactamente os primeiros a beneficiar de um regime de discriminação positiva. A mensagem não é portanto de consumir menos, de redimensionar a oferta desses serviços (o que teria até a óbvia consequência do aumento dos preços e, como tal, dos rendimentos operacionais dos intervenientes) para se adequar às contingências do mercado, mas sim para se continuar a consumir o mesmo (ou mais), imunizando à conta dos contribuintes esses agentes do mercado da realidade.
Lembremo-nos que estamos a falar de camiões e de barcos de pesca que consomem, num frete ou numa ida ao mar, milhares de litros de gasóleo, sendo que os primeiros já beneficia até, injustamente, de um regime mais que discriminatório em relação aos demais no que toca ao preço desses combustíveis.
Num tom mais ligeiro, poder-se-ia até dizer que a solução para muitos dos transportadores deveria ser a de encostarem os camiões e passarem a fazer os fretes em traineras.
A evolução que se regista no mercado já não é fácil de encaixar pelos agentes económicos, ou seja, o encaixe dos aumentos dos custos operacionais nos preços de forma directa ou por intermédio da diminuição da oferta dos serviços já não será fácil de digerir. As tais prioridades, e metas ambientais (completamente irrealistas - mas isso é outra conversa), que terão obviamente que apontar para os sectores de maior intensidade energética, essas então vão ser o fim da macacada.
Isto tudo, naturalmente, partindo do princípio (negado flagrantemente pelas actuações recentes do governo) que existe uma vontade efectiva e que esses objectivos são algo mais que soundbytes e powerpoints para encher cimeiras e mandar umas “bocas” ao Bush.