joralentejano
Super Célula
Concordo! Grande explicação Vivendo numa zona baixa, estes eventos para mim não me interessam nada. Tenho a serra aqui ao pé mas os aguaceiros provavelmente nem cá vão chegar, portanto, o que mais me importa neste evento é a chuva.E não, desenganem-se todos os que acham e vivem a cotas baixas que algum dia vão ver neve acumulada ou mesmo nevar com intensidade com entradas deste estilo, que embora polares trazem uma componente marítima muito intensa. As massas de ar ao executarem o seu percurso sobre o oceano absorvem muita água uma vez que não há um equilíbrio de fases, o que associado às temperaturas "muito baixas" dessas massas provoca uma saturação do ar muito rápida. O que acontece é que a partir do momento em que o ar está saturado não aceita mais vapor de água, e a partir deste momento começam a estabelecer-se ligações químicas entre as várias moléculas de água de modo a constituir gotas, libertando-se energia (reação exotérmica). Esta é a razão pela qual a cota de neve sobe em ambientes húmidos, é que quando as massas polares atravessam o mar são sempre suavizadas, e depois se a altitude não for suficiente para compensar estes fenómenos é para esquecer! No caso de Tondela e arredores são localidades que deviam ser objeto de estudo, porque neve por aqui é mesmo um caso peculiar, e até na serra do Caramulo, é mais fácil ver nevar em Bigorne e no Mézio, perto de Castro Daire, do que no Caramulo e têm altitudes semelhantes, no entanto as localidades que falei têm configurações geográficas diferentes, no caso de Bigorne e Mézio são localidades um pouco mais continentais, mas quem diz Bigorne ou Mézio (que são aqui mais próximas), diz Tarouca, ou Penedono enfim... No passado era um pouco mais frequente nevar por cá (de acordo com o que os antigos me contam, mas também não muito mais. A orientação do Caramulo parece efetivamente não ajudar com os fenómenos de foehn (se é que se pode falar neste fenómeno) do lado de cá, mas a própria orientação da serra parece também não a ajudar nos episódios de neve.
Aquilo que as nossas regiões precisam para nevar é algo antitético, porque por um lado precisamos de muito frio em altura e com características continentais, como as siberianas, ar com baixos valores de HR% o que aumentará o tempo de saturação e potenciará a descida da temperatura. E sim precisamos que esse frio se instale durante bastante tempo, e que não seja como estas entradas relâmpago oceânicas que pouco tempo prevalecem. A única forma disto acontecer é a dorsal anticiclónica conseguir penetrar minimamente ao nível da Grã-Bretanha e empurrar esse frio até PT continental. Miraculosamente precisamos de uma depressão/instabilidade o que não é propriamente simples se estivermos mergulhados numa massa de ar seco, daí que por vezes se fale nas famosas depressões retrógradas, que são criadas por norma no mediterrânico e chegam até nós. Outra opção que talvez fosse válida era a chegada de ar húmido com características subtropicais até bem perto de nós e que pudesse criar instabilidade, mas isto é muito relativo ainda no Janeiro passado, tivemos um caso semelhante de colisão de massas de ar, e pouco mais surgiu que neblinas ou nevoeiros.
Relativamente ao evento em si do 15 de Fevereiro de 2010, para muitos este dia não lhes ficou na memória, porque tanto quanto pesquisei (até porque na altura nada percebia, nem sabia que havia radar meteo, ou modelos meteorológicos) tratou-se de aguaceiros muito localizados e provenientes de uma depressão que se formou ao largo da costa PT, que efetivamente entraram enquanto estávamos mergulhados numa extensa massa de ar frio e seco, nesses dias esteve bastante vento de leste também, típico deste tipo de entradas continentais, o que é um adjuvante à queda da cota de neve. A precipitação iniciou-se sob a forma de aguaceiros, e esses aguaceiros foram muito localizados (o normal para aquela configuração atmosférica), e com temperaturas positivas, lembro-me que aqui a temperatura ia oscilando entre os 4.0ºC/4.3ºC no entanto devia até estar mais baixa, porque na altura a minha ignorância era tão grande (como continua a ser), que os meus registos de temperatura eram feitos com um simples termómetro junto de uma janela, o que como se pode imaginar inflaciona qualquer medição, por isso acredito mais que quando começou a chover a temperatura andasse algures entres os 2ºC/3ºC. E digo a chover, mas a verdade é que assim que chegaram os aguaceiros iniciou-se logo o água-neve e isto foi às 00h:15m, depois as células convectivas (aguaceiros) encarregaram-se do resto até fazer nevar e foram literalmente despejando o frio que encontravam em altura na atmosfera, fazendo a temperatura cair até valores próximos e ligeiramente abaixo de 0ºC (pela manhã intuitivamente arranjei outro sítio fora da janela para medir a temperatura, aliás foi até aí que percebi que medir a temperatura na janela tinha algo de estranho) nevou até perto das 9:30h
Quanto ao IPMA na altura IM, sim teve um grande fail na cota, previa julgo que uns 400/500m e foi o que se viu.
Deixo aqui as reanálises do ECMWF, ainda assim acho que o aqui está modelado é um pouco diferente do que aconteceu, especialmente relativamente às temperaturas aos 850hPa e aos 500hPa, mas isso só os membros mais antigos poderão confirmar:
2010 foi um ano tão interessante, aqui nevou graças ao facto de haver muito frio acumulado, não foi por acaso que nevou mais aqui em Arronches do que em Portalegre e no ponto mais alto de São Mamede em que segundo relatos era pouca.
O mais interessante é que as previsões eram muito parecidas às que o ECM prevê neste momento até às 240h com o anticiclone na Escandinávia, a única diferença é o facto do AA estar a oeste do Açores e não a sul. Tudo pode mudar até porque o GFS não vê mais nada a não ser um anticiclone com 1040hpa mas se aquilo que o ECM prevê se concretizasse era desta que esta seca tinha fim à vista e poderíamos ter eventos interessantes.